-Tava procurando mulher pelada? Clica aqui, então
Pra quem convive comigo isso não é novidade nenhuma, todos sabem que eu tenho uma quedinha por minas hippies. Hippies, punks, junkies, garotas problemas e suicidas. Tenho fascínio por pessoas que não dão valor a vida. Ta ai um mistério que não consigo solucionar, mas dane-se, isso é outra história.
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Eu estava no Fórum Social Mundial em Porto Alegre , capital mundial das “pé-sujo” e fazia um solão da porra. Tava com diarréia, desidratação e gengivite. Ia ao banheiro de cinco em cinco minutos, minha boca mais seca que múmia egípcia e a água da cidade contaminada... Os ambulantes mercenários vendiam garrafinhas d’água por R$1,50 e cerveja ruim por R$ 2,00 reais a lata. Um roubo! Tudo em nome do “anti-corporativismo”, hipócritas! Para não beber cerveja de uma grande empresa eu era super-explorado por uma fabriqueta gaúcha de mijo e por aqueles vendedores estelionatários. Tinha pouca grana no bolso e isso me impedia de beber tanto quanto eu queria. Uma coisa que me irrita é passar sede, pior que fome! Resolvi só tomar pinga, o que não me ajudava muito. Acordava às nove horas da manhã com um sol desgraçado me dando bom dia. Eu dizia “Bom dia seu grande filho da puta, obrigado por queimar meu cérebro, ter um câncer de pele, vai facilitar muito minha velhice”. A temperatura dentro das barracas de plástico, nas quais estávamos acampados era insuportável. Me sentia um sem-terra, um guerrilheiro, um desabrigado por desgraça natural como o Tsunami. Isso vinha bem a calhar com a temática esquerdista do Fórum. Talvez tudo que eles quisessem era nos proporcionar um workshop de como é a vida das classes exploradas. Ta certo, meus queridos, eu cresci numa quebrada de verdade e na minha rua tinha uma boca de fumo, vão dar palestra de realidade para os gringos que tão a fim de fazer um turismo barato aqui no PATROPI!
Porra! Meu intestino tava avisando: lá vem merda, garotão! Saí correndo como um louco até o banheiro mais próximo. Eu tinha três opções reais: os banheiros do parque municipal onde estávamos acampados, onde ficavam chuveiros, mictórios e privadas, e que se encontrava num estado miserável. Os banheiros químicos, que eram cabines de plástico, com uma espécie de privadinha, na qual não se encontrava descarga, a merda ficava ali olhando pra gente e boiando, à vontade. A última opção era o shopping center que ficava uns 15 minutos de caminhada, o que não estava nas minhas possibilidades. Ou então eu podia cagar ali no meio do chão, o que não causaria espanto a incrível aglomeração de hippies e anarco-punks sujos, que se juntava no local. Decidi usar o banheiro químico: forrei a parte da frente para não raspar o pinto na imundice e morri por cinco minutos. Minha alma saiu do corpo. Voltei a mim, me juntei aos caras.
Estávamos cobrindo o Fórum para um coletivo de comunicação. Éramos todos jovens recém formados na infame “comunicação social”: relações públicas, rádio e tevê e jornalismo. Ninguém tinha conseguido um emprego de verdade em uma grande rádio ou jornal impresso e então unimos nossas forçar em nome da justiça social e resolvemos fazer as coisas com as próprias mãos. Tinha uma porrada de minas lindas, com sandalinhas de couro, saias indianas e colares artesanais, mas eu não podia perder meu tempo com elas, já que nossa querida “líder”, Marina, era uma workaholic do inferno e não nos permitia fazer outra coisa a não ser filmar, filmar e filmar.
O lance era o seguinte: estávamos fazendo um documentário sobre ativismo social em parceria com uma ONG gringa e se tudo desse certo poderíamos conseguir uma verbinha para nosso coletivo. Todo mundo tava sem grana e vivendo à custa dos pais, que não queriam mais bancar ninguém. Tava todo mundo sem um puto nem pra cerveja e economizando até nas refeições. O cara que tava na pior situação era o Hebert, mulato, formado em rádio e tv, vindo da periferia de São Paulo que tinha conseguido se formar graças à “bolsas-esmola” do estado. O nego tinha talento nato pro teatro, mas tava numa pindaíba que dava dó agora que a verba tinha sido cortada. Se ele não arrumasse um trampo logo, ia acabar tendo que voltar para casa e fazer serviço de peão. Eu não tava tão ferrado, mas minha mãe tava me pressionando feito louca. Tinha sido despedido de uma editora astrológica, onde conseguira estágio no último ano de faculdade. O lance dessa editora era horóscopo e revista pro público feminino. Revista barata mesmo, pras classes C e D, exploração da ignorância alheia. Sacaneavam as meninas pobres que dava dó. E a gente copiava tudo da internet, não tinha que fazer nada: só copiar e colar. E aquelas garotas punham a vida ali:
“Cara Revista Melhor Amiga, engravidei e o pai da criança fugiu. Me deixou sozinha, se meus pais descobrirem me expulsam de casa. Já decidi fazer aborto, não tenho outra saída. Será que vocês poderiam me ensinar o melhor método? Já descobri algumas coisas: Chá de Erva X, enfiar um arame na vagina, tomar remédio Y(que pode matar a mãe por sinal) ou até bater na barriga. Tenho medo que possa acontecer alguma coisa comigo... O que eu faço?”
Fuja menina! Fuja que você não merece esse mundo. Um covarde bastardo que te engravidou e fugiu, pais otários que não tem diálogo com os filhos, miséria desumana que impede as pessoas de terem acesso à informação de verdade, solidão angustiante que transforma uma revista em “Melhor Amiga”. Todo mundo leu essa carta lá na redação, alguns até riram, eu queria responder, nem que fosse para falar pra ela não fazer o aborto. Mas a editora vetou: o maldito guru esotérico e dono da revista não permitia referências a aborto, drogas ou temas polêmicos nas suas revistas. Diabos! A menina ia cometer suicídio e ninguém podia falar nada? Que mundo era aquele? Recortando e colando dicas de beleza e reescrevendo milhares de vezes a mesma matéria sobre a primeira vez de uma garota sob títulos diferentes... ACORDEM! Alguém ai sabe como é a primeira vez de uma garota pobre nesse inferno chamado Brasil? Quantas garotas vão comprar velas vermelhas, lingerie nova e uma jantar especial para o namorado que amam e quantas vão estar deitadas em uma construção, trepando sem camisinha com um babaca, que insistiu a noite inteira, e quem sabe se aproveitou do seu estado etílico. Pura merda! Depois disso não demorou muito pra eu cair fora...
Por isso tudo eu estava lá em Porto Alegre gastando meu inglês tosco e o portunhol para falar com todos aqueles ativistas malucos e montar um documentário decente e sem garotas fazendo abortos com remédios tarja preta. No final das contas a gente nunca faz o que quer quando ta ganhando. Ou melhor, nunca pagam pra gente fazer o que gosta. Sua vida é uma encruzilhada em que de um lado está a realização pessoal e a pobreza e no outro a grana e a infelicidade. Eu por enquanto tava nessas de sobreviver comendo pão com mortadela à noite e bebendo Caninha 51. Não sabia até quando ia agüentar. Todos meus heróis morreram antes de ficar velhos ou se venderam... È triste pensar assim, né? Às vezes pensar dói mais que tomar um socão na cara... E olha que eu só tomei um soco na cara uma vez. Bom, estávamos lá: eu, a Marina, o Cagote com a sua namorada nipônica, o Hebert e o Mangabeira, que era um puta alcoólatra, pior que eu. O Cagote e a namorada tavam cagando mais que todo mundo junto, o cara ficava jogado no chão, perto das barracas, em cima duma lona quente, tomando soro caseiro e se lamentando:
_ Mano, deixa eu fazer um desabafo... Não faz sentido eu estar aqui, se eu tivesse bem, vai lá, mas eu to mijando pelo c*! Aqui não tem lugar pra cagar, é quente pra diabo, não tem água, onde é que eu vim parar?
_Relaxa, Cagote, a gente vai terminar essa porra rápido e ai a gente volta pra casa. Lá vai ter uma privada enorme e limpa onde você vai poder passar o dia todo evacuando relaxado. O papel-higiênico vai ser de primeira e não essa lixa que os caras põem nos banheiros públicos...
_ E a cor, mermão(meu irmão ele queria dizer)? Vai ser azulejo branco? Banheiro bom é branquinho... Pedindo pra você: "Senta. Senta e faz..."
_ Branquinho, mano, branquinho e sem tábua cagada. Você não vai mais ter que ficar forrando a privada toda vez que for sentar.
Agora a gente tava andando, fazendo uma tomada geral do Fórum. Duzentas mil pessoas, de todos continentes do mundo, dezenas de línguas, centenas de roupas, milhares de sonhos. Barracas de artesanato hippies, anarco-punks com moicanos, sem-terra com bandeiras, partidos de esquerda com panfletos. Musas com pezinhos sujos de areia, gringos vermelhos de sol. Utopias cagadas todos os dias em banheiros imundos, cortesia da excelente água gaúcha. Um hippie sujo e com dreadlocks encanou com a nossa filmagem:
_Hei, vocês não tem autorização da minha pessoa pra me filmarem.
O Mangabeira.
_Calma, cara, a gente só ta filmando o caminho.
O Cara tava louco não ouvia, devia ter fumado tanta maconha, misturada com chá de cogumelos e LSD que o cérebro tinha virado geléia.
_Ai, meu irmão, vocês vão vender essa fita ai e os caras vão copiar meu trabalho. Isso aqui é tudo idéia da minha cabeça, meus artesanatos. Minha pessoa é um artista. Não da pra ficar filmando meus trampos assim
Montuado de estátua de barro feitas por algum cara com deficiência motora, colares iguaizinhos ao de todo “hippie artista” que se encontra no mundo. Dava vontade de chutar tudo, pisar naquelas bostas e mandar o cara tomar banho. Pra não mandar tomar outra coisa...
_ Cara, na boa, a gente ta fazendo um documentário nem filmamos você.
_ Se liga meu irmão, vou chamar meus camaradas, se vocês não apagarem isso... Ta maluco, minha pessoa é esperta, ta sabendo? O negócio vai engrossar.
_Pronto a gente já apagou e tamo indo embora_ o Hebert queria encurtar a conversa.
- Cês, acha que eu não sei o que cês faz? Vão pegar esse vídeo recortar minha cabeça e me colocar peladão na internet, fazendo assim ó(simula sexo)! Que nem filme pornô...
Nessa hora a gente mal tava ouvindo o ogro, mas eu ainda sentia seu bafo fedorento na cara...
_Filho da puta – Falei.
_Mermão, só to cagando, to precisando ir no banheiro de novo, porra! Já caguei em Porto Alegre inteiro, no posto, no shopping, no restaurante, caraca!
_ Porra, Cagote! Você ta foda hein? Só fuma maconha e caga! Caga na barraca, no chão, na sua namorada...
_ Ta maluco mermão, na minha namorada não!
Senti uma pontada. Saímos correndo e chegamos a tempo no shopping... Lá o banheiro era limpinho...
***
Meu amor platônico pelas pé sujos devia ser edipiano... Minha mãe era meio hippie quando casou com meu pai... Na prática não tenho muita frescura com mulher, mas sempre me apaixono por uma gatinha alternativa. E quase nunca ajo. Fico só olhando, pensando, imaginando... Isso me rende um monte de história pra escrever... Só que troco todos contos, o prêmio Pulitzer ou o Jabuti, por uma menina com cérebro, sandalinha de couro, blusinha de alcinha e saia indiana. E uma boa bunda, porque ninguém é de ferro, né?
23/02/05.
Este conto tem alguns trechos inspirados na minha experiência real no Fórum Social Mundial de Porto Alegre, 2005. Na foto, eu, meu irmão Gabriel e Rodrigo "Pantera".
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